domingo, 24 de janeiro de 2010

IMPRESSÕES SOBRE O ANDAR DA HUMANIDADE













A queda do comunismo na Europa oriental e na União Soviética encerrou um período na história da humanidade e abriu outro, tendo como referências, de um lado, as práticas neoliberais, traduzidas pela redução drástica da intervenção do estado na economia e, de outro, o processo de globalização, que subtraiu a soberania do Estado-nação.


A vitória do ocidente em decorrência do colapso de seu adversário comunista foi a vitória de um tipo específico de capitalismo liderado à época por Reagan e Thatcher. Não se trata, portanto, da vitória de qualquer capitalismo, mas de um tipo que menospreza o Keynesianismo e o Estado de bem estar social, enfim, menospreza o modelo dominante de capitalismo ocidental pós-segunda guerra mundial.

Trata-se de um movimento robusto e de fôlego, em escala verdadeiramente mundial, “decidido a transformar todo o mundo à sua imagem, em sua ambição estrutural e sua extensão internacional.”

Com esse intuito, sem medo de errar, é possível afirmar-se que a “alienação” constitui-se no móvel ideológico condutor deste tipo de capitalismo no início do século XXI. A alienação se apresenta quando perdemos a compreensão do mundo e tornamo-nos alheios à realidade em que estamos inseridos, justificando o injustificável e maquiando a realidade que nos rodeia.

Essa alienação se apresenta em três aspectos: o primeiro é a lógica de sentir-se uma “peça” a mais na engrenagem do capital, sobre o qual não se tem controle ou poder de decisão. Esse sentimento acarreta o desinteresse pelas questões públicas, voltando-se o indivíduo para dentro de si mesmo; em outras palavras, interessamo-nos pela vida privada, porque em nossa casa temos poder de decisão, enquanto que no espaço público não.

O segundo aspecto da alienação é a formação da sociedade de consumo, vinculada a necessidades artificialmente estimuladas pelos meios de comunicação e não à decisão consciente do indivíduo em atender suas necessidades básicas. O publicitário Nizan Guanaes, ao tratar do marketing existente em torno do tênis marca Nike esclarece muito bem o nível de artificialidade a que chegamos e diz que “Nike é sublime. (...) Nike não é um tênis, um calçado, é um modelo de vida. Nike é um estilo e uma visão de mundo. Seus anúncios são evangélicos. Não vendem apenas, doutrinam. Não convencem só, convertem. (...) Nike faz o boy do Terceiro Mundo se sentir tão bem quanto se tivesse cheirando cola. Por isso um monte de boy que não podia ter Nike tem Nike. Porque se ele não tiver ele morre.”

O terceiro aspecto da alienação é enxergarmos, de nossa janela, a destruição da natureza, justificando-a a partir da idéia corrente de que a sociedade moderna está estimulando a produção de mercadorias necessárias ao bem estar humano, sinônimo de progresso.

Segundo o filósofo húngaro István Mészáros, a alienação “é a perda de controle sobre as atividades humanas que poderíamos e deveríamos controlar, ....é a racionalização da insanidade, o que cria a ilusão de ser a ordem correta das coisas”.

Mészários, explicando a alienação produzida pela lógica do capital cita dois exemplos: quando a invasão do Iraque começou, a justificativa para a guerra era a existência de armas de destruição em massa; passados três anos vemos massacres, ruínas, sofrimento, mas nada de armas de destruição em massa. Essa incongruência foi racionalizada, impedindo que aqueles que acreditaram na justificativa norte-americana se rebelassem. A própria noção de economia, segundo ele, sempre teve o significado de poupar; hoje é consumir, no último nível possível.

Em suma, a alienação faz com que aceitemos os paradoxos como naturais, como a ordem correta das coisas, enfim, como o único caminho possível. Ora, as lógicas de mercado e do capital necessitam dessa justificativa ideológica insana para oxigenarem-se.

Como resultado desse móvel ideológico temos a predominância do “caminho único”, por meio da disseminação da idéia de que não há alternativas possíveis. Ora, essa visão leva ao esmagamento da “política” e do “pensamento social”, pois a lógica do capital em si é alienante e tomou conta do nosso modo de vida, desde a mais tenra idade até a velhice, desde o ensino fundamental até as universidades. A alienação, paradoxalmente, está presente no espaço acadêmico, que deveria primar pelo pensar crítico e dialético.

A alienação, enfim, se apresenta no viés econômico acrítico, que acaba prevalecendo em qualquer debate, denunciando uma crescente desumanização da humanidade. A persistir tal estado de coisas, marcada por essa lógica insana, estamos caminhando, a passos largos, para um novo holocausto.

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